ANTIGO TESTAMENTO: PENTATEUCO
1. Introdução
O Antigo Testamento ou o Primeiro Testamento é uma coleção de textos sagrados importantes para três religiões: Judaísmo, cristianismo e islamismo. Muitas passagens do Alcorão foram inspiradas no testamento judaico. Já os judeus consideram este testamento como único livro sagrado chamado de Tanakh.
Ao estudar esses livros, precisamos ter em mente uma chave de leitura correta. O AT é uma literatura judaica situada na antiguidade, com mentalidades e noções próprias. Não poder ser considerado um bloco igual. Os textos representam várias tradições, às vezes, separadas por séculos. Além disso, a língua original foi o hebraico. Essa língua possui formas de expressões muito peculiares. Essas ressalvas ajudam ao iniciante no estudo do AT a tomar cuidar para não aplicar categorias modernas a tradições antigas.
2. Visão de Deus
A visão de Deus apresentada no AT difere do NT. Percebe-se ao longo dos séculos uma evolução pouco linear da imagem de Deus. Há textos de um Deus compassivo, de um Deus vingativo e até mesmo com ausência de Deus. No Pentateuco, há uma revelação do nome de Deus, Yahweh (Ex 3, 13-15). Seu nome significa apenas aquele que é, o existente. Essa divindade não pode ser vista por homens, nem seu nome pronunciado, deve-se chamá-la de Senhor (Adonai). Outro nome para Deus é Elohim. O curioso é que este último significa “deuses”. Deus fez uma aliança com o povo de Israel e revelou os mandamentos.
3. Visão de homem
Os antigos judeus entendiam que o homem é uma criatura feita à imagem e semelhança de Deus (Gn 1, 27). Seu ser é composto de dois elementos basar (carne, corpo) e néfesh (alma, vida). O sangue que sustentava e mantinha a vida. Após a morte, os falecidos iriam para o Sheol, a mansão dos mortos. Esta condição do morto é vista como esquecimento (Sl 88, 12-13) (COELHO FILHO, 2008). Enquanto vive, o dever do homem é observar a Toráh para ter na vida presente bênção e longevidade[1].O coração (lebab) que era o centro dos pensamentos e da razão. Os rins (helayot) representavam a sede das emoções.
4. Visão de mundo
Os hebreus entendiam que a Terra era circular com uma superfície plana e circundada por mares. Na parte superior, havia ar e águas. Na inferior, era um grande abismo. Debaixo do solo, situava-se o Sheol. A Terra era imóvel. A Palestina era o centro do mundo e se conhecia somente as regiões ao redor.
5. O tempo
O calendário judaico era baseado no ciclo da lua e tinha doze meses. A cada dois anos havia um décimo terceiro mês. A contagem dos anos fazia-se com referência á criação ou ao tempo de vida de alguma pessoa importante ou evento marcante. Em 2009, para os judeus é o ano 5769 desde a criação do mundo. O início do ano se dava na primavera.
6. Método de Estudo Bíblico
Existem alguns passos a serem observados para uma boa interpretação: a) Identificação do gênero, estilo e a finalidade do texto. b) Obter informações sobre o autor e seu contexto: Quem escreveu? Quando e onde foi escrito? Qual o tema ou a razão principal do escritor? A quem se dirigiu o escritor? c) Leitura total e identificação da ideia principal, a afirmação do autor, através da contagem das palavras mais repetidas. d) Ler cuidadosamente o texto. Ter atenção com as vírgulas, pontos finais e parágrafos, pontos de exclamação e interrogação, dois pontos e ponto e vírgula. e) Ter atenção com o sentido das palavras essenciais para a compreensão do texto. Identificar como o autor desdobra a sua ideia principal, comprovando-a ou a rejeitando. f) Elaborar um mapa conceitual ou esquema para visualizar a ideia principal e como ela se conecta às suas ideias afluentes. g) Confrontar, associar os dados da leitura atual ao acervo mental adquirido em leituras anteriores. h) Aplicar o texto à finalidade para qual você leu e interpretou a obra sem forjar o autor apenas dialogar com ele.
Para isso é bom ter um caderno de anotações. Escolher um texto completo, sem cortes, e anotar cada versículo e as ideias contidas nele. Deve-se ler sobre o mesmo assunto noutros lugares para comparar. No final, é possível ter uma ideia clara do texto bíblico. Não se conclui nada a partir de um só versículo.
7. Pentateuco
Na antiguidade, o texto era conservado em cinco rolos de tamanho quase igual. O Pentateuco é composto pelo Gênesis (origem, começo), Êxodo (saída), Levítico (lei dos sacerdotes da tribo de Levi), Números (recenseamentos), Deuteronômio (segunda lei). Os judeus usavam as primeiras palavras de cada livro para nomeá-los.
Não existe um único autor para esses livros. Atualmente, se considera um conjunto de autores que podem ser reunidos em 4 grupos: Javista, Eloísta, Sacerdotal e Deuteronomista. Pelo modo de escrever, deduzem-se essas tradições. Sua redação final se deu depois do Exílio, em 400 a. C. Mas o começo deve ter sido na época de Salomão.
7.1.Gênesis
O Gênesis é o livro das origens. O seu propósito é responder àquelas perguntas fundamentais como: De onde viemos? Qual origem do sofrimento? Como começou a história da fé? Por isso, o livro pode ser dividido em duas partes: 1 – Narrativas das origens; 2 – História dos patriarcas. Os 11 primeiros capítulos fazem uma catequese sobre as origens através de histórias. A composição do Gênesis teve muita influência dos povos vizinhos de Israel. Existem vários gêneros como mitos, lendas, genealogias e sagas. Essas tradições foram sendo transmitidas oralmente desde o século XIII até século V antes de Cristo. Após o exílio, os sacerdotes puseram as tradições por escrito. E tenta refletir justamente sobre a angústia e a falta de esperança provocadas pelo cativeiro. As memórias registradas no Pentateuco envolvem um período a partir de 3.000 a. C. até sua redação final. Por volta de 1770 os patriarcas estavam no Egito.
I. História das Origens (1,1-11,32)
1,1-2,4a: Criação do universo e dos seus habitantes (segundo a tradição Sacerdotal: P).
2,4b-3, 24: Formação do homem e da mulher. Origem do pecado (tradição Javista: J).
4,1-24: “História de dois irmãos”, Caim e Abel. Descendência do primeiro.
4,25-5,32: Set e a sua descendência.
6,1-9,17: Corrupção da humanidade e Dilúvio (anti-Criação).
9,18-10,32: Re-criação, a partir de Noé, o homem novo. Lista de povos.
11,1-9: Torre de Babel: a humanidade constrói uma sociedade sem Deus.
11,10-32: Descendência de Sem até Abraão, promessa de um povo novo.
II. História dos Patriarcas (12,1-50,26)
Ciclo de Abraão (12,1-23,20): vocação, emigração para Canaã e Egito. Nascimento de Isaac e Ismael. Morte de Abraão.
Ciclo de Isaac (24,1-27,46).
Ciclo de Jacó (28,1-36,43): já a partir de 25,19, Jacob começa a tornar-se a personagem principal, tanto em relação ao pai (Isaac), como em relação a seu irmão Esaú.
Ciclo de José (37,1-50,26): o penúltimo dos filhos de Jacó, vendido como escravo para o Egito, faz a ligação histórica e teológica com o livro seguinte, o Êxodo. É um ciclo muito especial, também chamado História de José.[2]
7.2. Êxodo
O tema principal deste livro é a libertação do povo da escravidão no Egito. A personagem central é Moisés. Essa história se completa com a Aliança do Sinai, um ponto importante para entender o começo da religião judaica de forma organizada. A partir da conquista da Terra prometida os hebreus começam a formar uma nação. O êxodo é um acontecimento fixado pela história por volta de 1250.
I. “Opressão” e “Libertação” dos filhos de Israel no Egito. Este é o tema fundamental de 1,1-15,21. Nesta secção merecem especial relevo as peripécias no Egito (1,1-7,8), como um povo que nasce no sofrimento. Seguem-se as pragas (7,8-12,32), como meio violento de libertação.
II. Caminhada pelo deserto (15,22-18,27) do povo, agora livre do Egito.
III. Aliança do Sinai (19,1-24,18). Esta aliança é o encontro criacional ou fundacional de Javé com os “israelitas”, em que o Senhor se dá a si mesmo ao homem e restitui cada homem a si mesmo, e em que o homem aceita a dádiva pessoal de Deus e se aceita a si mesmo como dom de Deus com tudo o mais que lhe é dado: a natureza, a razão, a Lei, a História, o mundo. Por sua vez, a dádiva e a sua aceitação também reclamam dádiva mútua e, portanto, responsabilidade. O pecado surge como possibilidade da liberdade humana; mas Deus pode sempre recomeçar tudo de novo.
IV. Código sacerdotal, com especial relevo para a construção do santuário (25,1-31,18). A execução do mesmo vai ser revelada em 35,1-40,33, com a correspondente organização do culto. Esta narrativa está encerrada numa inclusão significativa: 40,34-38 descreve a descida do Senhor sobre o santuário com as mesmas características (nuvem, glória, fogo) com que 24,12-15a descreveu a descida do Senhor sobre o Sinai, mostrando, assim, que o santuário assumiu o papel do Sinai como lugar da manifestação de Deus. É a presença da ideologia sacerdotal (conhecida por fonte P), que projeta retrospectivamente no Sinai a imagem do segundo templo, do seu sacerdócio e do seu culto – em suma, o ideal da comunidade judaica pós-exílica.
V. Renovação da Aliança do Sinai, relatada em 32,1-34,35.
VI. Código sacerdotal (35,1-40,38): execução das obras relativas ao santuário.
7.3. Levítico
A partir da famosa versão grega dos Setenta, este livro recebeu o nome Levítico por causa da importância dos sacerdotes da tribo de Levi. O texto tem um forte acento litúrgico e de lei. Essas informações foram recolhidas no século VI pelos sacerdotes em Jerusalém.
I. Código Sacerdotal (1,1-16,34): inclui as seguintes secções:
1. Ritual dos Sacrifícios (1,1-7,38): holocausto (1), oblações (2), sacrifício de comunhão (3), sacrifício de expiação (4,1-5,13), sacrifício de reparação (5,14-26), deveres e direitos dos sacerdotes (6-7).
2. Consagração dos sacerdotes e inauguração do culto (8,1-10,20): Ritual da consagração de Aarão e seus filhos (8), primeiros sacrifícios dos novos sacerdotes (9), irregularidades e normas sobre os sacerdotes (10).
3. Código da pureza ritual (11,1-15,33): animais puros e impuros (11), purificação da mulher que dá à luz (12), purificação da lepra (13-14), impureza sexual (15).
4. Dia da grande expiação (16,1-34).
II. Código de Santidade (17,1-26,46): é um conjunto de leis introduzidas pela fórmula “Sede santos porque Eu sou santo”, que inclui leis sobre a imolação de animais e leis do sangue (17), leis em matéria sexual (18), deveres para com o próximo (19), penas pelos pecados sexuais (20), santidade dos sacerdotes (21-22), calendário das festas (23), luzes do santuário e pães da oferenda ou da proposição (24,1-9), Ano Sabático e Jubileu (25), bênçãos e maldições (26). Como se torna evidente, neste grande conjunto de leis cultuais, quase metade do livro é constituída pelo “Código de Santidade” (17-26).
III. Apêndice (27,1-34): os votos.
7.4.Números
Este livro é narrativo com alguns trechos de leis. Seu conteúdo se liga ao Êxodo. Pois retoma o tema da marcha no deserto desde o Sinai até as margens do Jordão.
I. No deserto do Sinai (1,1-10,10). Referem-se as ordens de Deus para a caminhada através do deserto com a disposição do acampamento das tribos, os deveres dos levitas e outras leis de carácter ritual.
II. Do Sinai a Moab (10,11-21,35). Os acontecimentos mais importantes desta segunda parte estão marcados por etapas geográficas, algumas das quais são difíceis de identificar. Descreve-se a caminhada direta para Cadés-Barnea, mesmo na fronteira sul de Canaã e, depois, a inflexão para oriente e a errância penosa durante quarenta anos através do deserto até à chegada a Moab, já na fronteira da Terra Prometida.
III. Na região de Moab (22,1-36,13). Começando com a bênção de Balaão, as narrativas desta terceira parte apresentam um novo recenseamento dos israelitas, descrevem a nomeação de Josué para substituir Moisés, contêm algumas prescrições de caráter cultual, narram a luta contra os madianitas e a partilha de Canaã com a instalação das tribos de Rúben, Gad e parte de Manassés em Guilead, na Transjordânia, e a recapitulação das etapas do Êxodo.
7.5. Deuteronômio
A tradição deste livro difere-se do resto do Pentateuco. A fonte usada pelos escritores é perceptível até o 2º Livro dos Reis. Por isso, esse conjunto de livros é chamado de História Deuteronomista. No Deuteronômio começa uma nova maneira de contar a história do povo de Israel. Sua redação final deve ter acontecido pelos séculos VI e V. O texto trata dos discursos de Moisés e seus últimos dias.
I. Primeiro Discurso (1,6-4,43): de forma historicizante, recapitula o passado, desde a planície desértica da Arabá até à entrada na Terra Prometida de Canaã.
II. Segundo Discurso (4,44-28,68): Moisés apresenta os fundamentos da Aliança e as determinações da Lei.
Código Deuteronômico: 11,29-26,15.
III. Terceiro Discurso (28,69-30,20): últimas instruções de Moisés.
IV. Apêndice (31,1-34,12): narra os últimos dias de Moisés, com cânticos e bênçãos, bem como a sua morte.
8. Temas da Teologia do Pentateuco
O Pentateuco contém os fundamentos da primeira aliança. Pois conta como esta se deu, como se organizou o culto, construiu o santuário e instituiu os sacerdotes. A base da fé israelita aparece no decálogo. Esse conjunto de escritos nos dá uma revelação de Deus e da religião antiga dos judeus.
a) Criação do céu e da terra: Gn 1,1ss.
b) Criação do homem: Gn 1, 27.
c) A origem do pecado: Gn 3, 1-24.
d) A origem da violência: Gn 4, 1-16.
e) A renovação do mundo: Gn 6, 5ss.
f) O chamado de Abraão: Gn 12.
g) O chamado de Moisés: Ex 3.
h) A revelação do nome de Deus: Ex 3, 13-15.
i) A libertação do Egito: Ex 13, 17ss.
j) A origem da Aliança: Ex 19.
k) A lei: Ex 20.
l) A construção do santuário: Ex 35.
m) O credo de Israel: Dt 6.
n) A morte de Moisés: Dt 34.