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domingo, 29 de setembro de 2019

SUICÍDIO E O JUÍZO DA ÉTICA CRISTÃ



Em que a teologia pode contribuir para o Setembro Amarelo?

Temos de focar na prevenção e não na condenação do suicida.
Quando começa a campanha do Setembro Amarelo, aparece nas redes sociais um assunto muito polêmico que sua compreensão errônea mais atrapalha do que ajuda. Há uma leitura fundamentalista da Bíblia que considera que suicidas perdem a salvação. As pessoas fundamentalistas acabam insistindo nesta interpretação e promovem um grande desserviço para a luta pela prevenção ao suicídio. Este é um exemplo de mau uso da Bíblia. O fundamentalista insiste que quem pensa o contrário está ignorando a Bíblia e que ninguém mais conhece a verdade. São argumentos mais comuns para sustentar a todo custo a condenação moral do suicida. Nesta argumentação, precisamos ter claro que não estamos defendendo o suicídio, estamos argumentando a favor do respeito à memória do suicida.
Primeiro – há personalidades bíblicas que desejaram a morte. Algumas personalidades bíblicas enfrentaram situações difíceis que as levaram a pedir a morte: a) O profeta Elias pediu a Iahweh para que lhe tirasse a vida (1 Rs 19, 4); b) Jó diz que preferia morrer estrangulado a passar pelo sofrimento (Jo 7, 15); c) Moisés lamenta com Iahweh as dificuldades em liderar os israelitas pelo deserto e pede a morte (Nm 11, 14).  São situações humanas. Em todos estes casos, Deus não condena a atitude dessas pessoas, ele, antes de tudo, as encoraja e lhes devolve a esperança.
Segundo – há casos de suicídios na Bíblia. Podemos analisar três casos de suicídio no Antigo Testamento. Em 2 Sm 17, Aquitofel se enforcou por causa de um plano malogrado. Há duas outras situações: Em 1 Sm 31, 1-6, Saul suicida diante da ameaça dos inimigos. Sansão suicida puxando as colunas da casa sobre ele e seus inimigos (Jz 16, 28-30). São suicídios em situação de guerra. Mas mesmo Sansão cometendo um suicídio, ele é incluído no rol dos heróis da fé em Hebreus 11. No Novo Testamento, temos o episódio notório do enforcamento de Judas (Mt 27, 5). Neste caso, a atitude de Judas é mais condenada por ter traído Jesus do que por ter se enforcado.
Terceiro – não há relação entre suicídio e condenação eterna, literalmente, na Bíblia. Não existe nenhuma condenação explícita dizendo “os suicidas não herdarão o reino dos céus”. Quanto aos homicidas, sim, existe claramente uma condenação. As argumentações de condenação do suicida parte de outras premissas. E não de casos e de citações diretas do texto bíblico. Aliás, a posição de Jesus é a de que todos os pecados podem ser perdoados, exceto o pecado contra o Espírito Santo (Mc 3, 28-30). Além disso, o próprio Jesus insiste para que não julguemos os outros (Mt 7,1).
Por último - a misericórdia precisa exceder o juízo. Quando você quer usar a Bíblia para condenar as pessoas, você encontrará muitas razões. De fato, há muitas atitudes que os autores bíblicos condenam e que nossa ética contemporânea também condena. Porém, do ponto de vista da moral de Jesus, temos de propor mais a ajudar do que a condenar: “Sede misericordioso como o vosso Pai é misericordioso” (Lc 7, 36). Portanto, considerando que as causas do suicídio têm relações patológicas. Não podemos condenar as pessoas por estarem doentes, antes de tudo, precisamos ajudá-las a ser tratar. Está aí este esclarecimento para que se evite o uso da Bíblia para fins indevidos!

quinta-feira, 19 de setembro de 2019

Direito e Justiça segundo os profetas


ÉTICA SOCIAL NO PROFETISMO

O profetismo no antigo Israel tinha várias funções. Dentre as frentes de atuação dos profetas, podemos destacar seus discursos éticos.
AMÓS. O profeta Amós critica duramente a situação de luxo dos nobres de Sião e da Samara (6, 1-3). Os vv. 4-6 contêm expressões que denotam a condição de riqueza e de conforto das classes nobres: “leitos de marfins”, “divãs”, sinal de que dormiam bem; “cordeiros e novilhos”, “música”, “óleo e vinho”, sinal de que comiam e se divertiam bem. Amós acusa esses nobres de não se preocuparem com a ruína. Então, diz que eles serão exilados como punição.
No v. 8 Yahweh diz que odeio o orgulho e os palácios daquele povo e, então, levantará uma nação para aniquilar Israel (v. 9-14). A riqueza é criticada pelo profeta (“as casas de marfim”, 3, 15). A razão é que os ricos se esqueceram de cuidar de Israel e ocupam seu tempo com o luxo.
Ele chega a dizer no capítulo 8, que eles querem “eliminar os pobres da terra” e vivem falsificando as balanças (vv. 4-5). Eles ainda querem comprar o fraco com dinheiro e o indigente com um par de sandálias (v. 6). Um versículo chave da ética social de Amós é 5, 24: “Que o direito corra como água e a justiça como um rio caudaloso”.
ISAÍAS.  Este profeta se opõe aos rituais religiosos hipócritas. Ele diz que p jejum que Yahweh quer é a prática da justiça. Em Isaías 58, há uma sequência de práticas necessárias para com o próximo: a) Romper os grilhões da iniquidade (v 6), b) repartir o pão, c) acolher os desabrigados, d) vestir os nus, e) cuidar dos seus (v. 7). Os ricos e dono do poder estavam explorando os seus trabalhadores (58, 3). Isaías também utiliza os princípios do direito e da justiça para fundamentar sua ética (58, 2).
MIQUÉIAS. O profeta reclama que o fiel e justo desapareceram da terra (7, 2). As pessoas deixaram de cumprir o bem. O príncipe e o juiz exigem gratificação para fazer o bem (7, 3). O tema da justiça também está presente no discurso deste profeta. Ele resume toda a motivação da prática do bem. Nada mais é exigido do que “praticar a justiça, amar a bondade e te sujeitares a caminhar com teu Deus!” (6, 8).


A antropologia do Cohélet


A CONDIÇÃO DO HOMEM NA LITERARURA SAPIENCIAL

COHÉLET. O autor do Cohélet desenvolve uma reflexão franca sobre a situação do homem neste mundo. A vida é transitória, tudo se repete, o homem se afadiga e não tira proveito da vida. Viver é uma tarefa ingrata. E o pior de tudo é que o destino do sábio e do tolo é o mesmo. A sabedoria foi um objetivo do autor, mas ele diz que isso também é vaidade (1, 3-17; 2, 14-15).
Como um filósofo epicurista, o Cohélet diz que a felicidade do homem é comer e beber (2, 24). A sua felicidade está em desfrutar do bem-estar e do produto do seu trabalho (3, 12). Mas há outras coisas que incomodam o pregador, como a existência do mal no mundo: “no lugar do direito encontra-se o delito, no lugar da justiça, lá se encontra o crime” (3, 16). Os oprimidos vivem sem esperança, de tal sorte que mais feliz é aquele que ainda não nasceu (4, 3).
A sorte do homem é idêntica a dos animais. Todos caminham para a morte.  Segundo o autor, não há garantias de continuidade e de recompensa: “Quem sabe se o alento do homem sobre para o alto e se o alento do animal desce para baixo, para a terra?” (3, 21). O Cohélet não tem uma expectativa formada sobre a vida futura. A única coisa que resta ao homem é alegrar-se com suas obras.
Uma grande vaidade que é a causa de muitos males é o acúmulo de riquezas. O trabalho penso em troca de uma riqueza insaciável é vaidade (4, 7). Mais vale é busca a companhia dos outros para melhor enfrentar a vida. Mesmo diante deste quadro de esforço mínimo pelas preocupações da vida, o Cohélet aconselha viver de modo prudente.
Ele aconselha no culto buscar mais ouvir do que os rituais. Daí procedem alguns deveres diante de Deus: Ser parcimonioso com as palavras, cumprir as promessas. (5, 1-6).
A ambição pela riqueza é algo insaciável. Quem ama o dinheiro nunca está satisfeito. O Cohélet considera esta preocupação como um grande mal do mundo. Ele critica aqueles que vivem para acumular riquezas. Eles fazem maus negócios. E acabam sem nada (5, 12-16). Outro grande sofrimento com a riqueza é ter muitas coisas e nele poder usufruir delas (6, 1-8).
Uma preocupação que percorre o livro é a de que proveito tira o homem do esforço da sua vida? O Cohélet está cobrando, no auge de sua franqueza, uma retribuição necessária da parte de Deus. Mas ele não tem esta crença. Na vida, ele já viu justos sofrerem e ímpios sobreviverem (7, 16). Assim como justos que são tratados como ímpios e, ímpios como justos (8, 14). Portanto, nem a bondade e nem a maldade garante o destino de um homem. Há um tempo para cada coisa, mas a infelicidade do homem é não saber quando algo vai acontecer (8, 7). Às vezes, nem mesmo a morte serve de lição para os que ficam (8, 10).
Aliás, a morte nivela a todos o bom e o mau (9, 1-4). No capítulo 9, o Cohélet revela o motivo de seu tratamento franco sobre a condição humana. Segundo sua concepção, não há retribuição para ninguém de acordo com suas obras. Os mortos não sabem nada e sua lembrança é esquecida. Eles não participarão de mais anda debaixo do sol (9, 5-6). No Xeol, não existe obra, nem conhecimento e nem sabedoria (9, 10). As obras não são garantidas pelo esforço, são dadas pela oportunidade (9, 11). Portanto, tudo é incerto e o esforço nesta vida é vaidade.

domingo, 8 de setembro de 2019

9º - Apocalíptica Judaica


LITERATURA APOCALÍPTICA: DANIEL

9.1. Introdução

Ainda que existam poucos livros apocalípticos na Bíblia, este tipo de texto era muito comum entre os judeus antigos. Além de Daniel e do Apocalipse de João, o livro de Enoque I é um apocalipse apócrifo bastante conhecido. Ele foi escrito entre 170 e 64 antes de Cristo. Algumas reminiscências deste livro aparecem na Epístola de Judas (13-15). As influências apocalípticas estão também em Mateus 24-25 no discurso escatológico de Jesus.
O gênero apocalíptico é um tipo de literatura revelativa dentro de um formato narrativo no qual um anjo comunica ao ser humano informações inacessíveis. Essas informações têm a ver com a salvação nos fins dos tempos e com a realidade do mundo sobrenatural.[1]De modo geral, as características de um apocalipse são narrativas de visões e de viagens celestiais que revelam a descrição de lugares extramundanos e do destino da humanidade ou de um povo. São textos repletos de simbolismos.A literatura apocalíptica tem conexão com o profetismo, com a sabedoria e com a escatologia.
As narrativas apocalípticas começam por visões e sonhos. Daniel tem um sonho com quatro feras (Dn7, 1-8). João tem uma visão e recebe um convite para subir até os céus (Ap 4, 1-2). Enoque teve uma visão do céu e falou com Deus (En 1, 2). Em seguida, há uma descrição de anjos, criaturas estranhas, trovões, relâmpagos e destruição. São textos que refletem uma situação de sofrimento do povo de Israel. Apesar das imagens desoladoras, eles apontam para uma esperança da parte de Deus.
Há um pequeno apocalipse em Isaías 24 a 27 que descreve a devastação que Yahweh fará da terra. Os elementos apocalípticos se misturam com a tradição profética.

9.2. Daniel

Daniel foi levado para o exílio da Babilônia e lá viveu no palácio de Nabucodonosor. Mas as profecias contidas neste livro envolvem vários períodos da história.  A fase final de Daniel trata do período do helenismo. Ele está dividido em duas partes: Uma parte histórica e uma parte profética.
Daniel pode ser dividido da seguinte forma: 1. Os jovens hebreus na corte de Nabucodonosor (Dn 1), 2. O sonho de Nabucodonosor: a estátua compósita (Dn 2). 3. Adoração da estátua de ouro (Dn 3, 1-30). 4. O sonho premonitório e a loucura de Nabucodonosor (Dn 3, 31-34). 5. O festim de Baltazar (Dn 5-6). 6. Daniel na cova dos leões (6, 2). 7. Sonho de Daniel: as quatro feras (Dn 7). 8. Visão de Daniel: o carneiro e o bode (Dn 8). 9. A profecia das setenta semanas (Dn 9). 10. A grande visão (Dn 10-12). 11. Susana e o julgamento de Daniel (Dn 13). 12. Bel e o drgão (Dn 14).



[1] TAYLOR, Richard A. Interpreting Apocalyptic Literature: An Exegetical Handbook. Grand Rapids: Kregel Academic, 2016, p. 36.

8º - Literatura Profética


LITERATURA PROFÉTICA

8.1. Introdução

A Literatura Profética envolve profetas de vários períodos: a) Os profetas do século VIII que são Amós, Oseias, Jonas, Isaías e Miqueias; b) Os profetas do final do período pré-exílico e exílico que são Jeremias, Naum, Habacuque, Sofonias e Ezequiel; d) os profetas do período pós-exílico que são Daniel, Joel, Abdias, Ageu, Zacarias e Malaquias[1]. O livro de Daniel será apresentado como profético e apocalíptico.
            A forma literária básica desta literatura é oráculo. O profetismo era um fenômeno religioso comum nas religiões do antigo Oriente. Os 450 profetas de Baal mencionados no 1º livro dos Reis é um exemplo deste hábito fora do culto javista. Durante o período da monarquia havia muitos profetas em Israel, chegando a existir confrarias de profetas. Em 1º Samuel 10 aparece um bando de profetas descendo do lugar alto com seus instrumentos musicais. Estes homens entravam em êxtase embalados pela música e transmitiam suas mensagens.
            Os profetas eram considerados intérprete da palavra de Deus. Eles tinham acesso às mensagens por meio de visões, pela audição ou pela inspiração interior. Mas a única função do profeta não esta. Amós e Oseias no século VIII criticam a situação social da monarquia.  Amós critica a opressão ao pobre, a cobrança de impostos e o crescimento da classe dos nobres. O profeta enumera a situação luxuosa desses nobres: Eles vivem tranqüilos, dormem em leitos de marfim, comem carne, bebem vinho, ouvem música e usam o melhor dos óleos (Am 6, 1-7). Oseias denuncia as idolatrias e as agitações políticas.[2]
            Portanto, os profetas serviam para aconselhar o rei, falar sobre o futuro, mas também para alertar o povo da fidelidade a Javé. Eles faziam duplamente uma crítica religiosa e política de sua época. A visão dos profetas como meros “adivinhos” é reducionista.

8.2. Profetas do século VIII

a)    Amós – Este profetizou durante os reinados de Ozias e de Jeroboão. Atuou no santuário de Betel e na Samaria. O seu livro pode ser dividido em: 1. Julgamento das nações vizinhas de Israel e do próprio Israel (1, 3-2,16), 2. Advertências e ameaças a Israel (3-6), 3. As cinco visões (7-9, 10), 4. Perspectivas de restauração e fecundidade paradisíaca (9, 11-15). Neste livro, o profeta condena a vida corrupta das cidades e as injustiças sociais.
b)   Oseias – Ele atuou no tempo dos reis Ozias, Joatão, Acaz, Ezequias e Jeroboão. Era oriundo do reino do norte. A divisão de Oseias pode ser feita assim: 1. O casamento de Ozeias (1, 2-30, 2. Crimes e castigos de Israel (4-14, 1), 3. Conversão e renovação de Israel (14, 2-10).O período do ministério de Oseis foi marcado por corrupção moral e religiosa, o tema principal de sua mensagem é o amor de Deus desprezado pelo seu povo.
c)    Jonas – É um livro de gênero diferente.  Ele é uma novela sobre a aventura de um profeta desobediente que quer desistir de sua missão e que depois reclama de Deus do sucesso da sua missão. Há aqueles que o classificam como parábola profética ou como conto.[3]O livro contém apenas 4 capítulos e seu enredo segue esta sequência: Yahweh manda Jonas ir a Nínive pregar, mas ele tenta fugir de navio e acaba sendo lançado ao mar (Jn 1, 1-16), ele é engolido por um grande peixe, depois de três dias, é devolvido à terra (2), na segunda chamada de Yahweh, Jonas vai a Nínive, prega e o povo se converte (3), Jonas reclama do sucesso da missão (4).
d)   Isaías – Ele nasceu por volta de 765 antes de Cristo e recebeu a sua vocação no Templo de Jerusalém de anunciar a ruína de Israel e de Judá como punição pelas infidelidades do povo.
A divisão do livro: Parte I - 1. Ruína e restauração de Judá (1–5), 2. Narrativa (6-8), 3. Agentes de bênção e julgamento (9–12), 3. Agentes de libertação e julgamento (40–45), 4. Oráculos contra nações estrangeiras (13–23), 5. Julgamento e libertação de Deus, 6. Sermões éticos (28-31), 7. Restauração de Judá e Davi.
Parte II - 1. Paraíso perdido e recuperado (34–35), 2. Narrativa (36-39), 3. Agentes de libertação e de julgamentos (40-45), 4. Oráculos contra Babilônia (46–48), 5. Redenção através do servo do Senhor; glorificação de pessoas (24–27) de Israel (49–55), 6. Sermões éticos (56-59) e 7. O Paraíso recuperado (55–66).
e)    Miqueias - Este profeta atuou antes da tomada de Samaria até a invasão de Senaquerib. O esboço da obra: Introdução (1, 1), I. Primeira rodada de julgamento e salvação (1, 2–5, 15), A. O julgamento de Deus sobre apostasia e pecado social em Samaria e Judá (1, 2–3, 12), B. Palavra de esperança de Deus para Israel (4, 1–2, 15), II Segunda rodada de julgamento e salvação (6, 1–7, 20), A. A disputa de Deus com Israel (6, 1-8), B. A reprovação de Deus pelos pecados sociais de Israel (6, 9–16), C. O profeta lamenta a condição de Israel (7, 1-7) e D. Salmos de esperança e louvor (7, 8–20).

8.3. Os profetas do final do período pré-exílico e exílico

Nesta seção, apresentaremos Jeremias, Naum, Habacuque, Sofonias e Ezequiel.
a)    Jeremias – O texto abre com o relato da vocação do profeta (1, 4-19). O livro pode ser dividido em: 1. Oráculos dirigidos ao povo de Deus: 1,1-25,14. 2. Oráculos contra as nações estrangeiras: 25,15-38. 3. Relatos biográficos de Jeremias: 26,1-45, 5.4.  Oráculos contra as nações estrangeiras: 46,1-51,64. 5. Apêndice: 52,1-34.
b)   Naum - I. Em 1,9-2,3 há pequenos oráculos dirigidos alternadamente a Judá (1,9-10.12-13; 2,1.3) e a Nínive (1,11.14; 2,2): para Judá fala-se de consola­ção e alegria; a Nínive e ao seu rei anuncia-se o castigo. II. 2,4-3,19 é dedicado à destruição de Nínive. Em 3,8-11 o profeta inclui o exemplo de Tebas, como dissemos, para mostrar que todas as defe­sas da cidade de Nínive são inúteis. O livro termina num cântico fúnebre, apresentando o desastre como consumado (3,18-19).
c)    Habacuque – I. Diálogo entre o profeta e Deus (1,2-2,4), formado por duas queixas do profeta (1,2-4 e 1,12-17) e duas respostas de Deus (1,5-11 e 2,1-4). A pri­meira queixa coloca o problema da justiça: porque triunfam os ímpios? A pri­meira resposta divina não satisfaz o profeta, pois os babilônios acabam por se exceder e são mais cruéis do que os outros. Por isso, o profeta queixa-se de novo (1,12-17), não compreendendo como Deus olha em silêncio para os traidores. A segunda resposta aponta para o cumprimento da pala­vra divina: o profeta recebe a palavra e aguarda o seu cum­primento. II. Maldições contra o opressor (2,5-20): inclui cinco im­precações, con­­de­nando todos os crimes cometidos pela tirania dos poderosos. III. Um salmo (3,1-19) que celebra o triunfo defi­nitivo de Deus na Natu­reza e na História.
d)   Sofonias – I. O Dia do Senhor em Judá (1,2-2,3), um dia de juízo universal, tenebroso e terrível, que afeta principalmente Judá. II. Oráculos contra as nações (2,4-3,8), vizinhas de Judá, e um último (3,1-8) dirigido contra Jerusalém. III. Promessa de restauração (3,9-20). É uma mensagem de alegria pela presença do Senhor em Jerusalém e pelo «resto de um povo pobre e humilde» (3,12), salvo por Ele.
e)    Ezequiel – I. Vocação para o profetismo: 1,1-3,27; II. Oráculos de ameaça contra Judá e Jerusalém: 4,1-24,27; III. Oráculos contra as nações: 25,1-32,32; IV. Oráculos de salvação para Israel: 33,1-39,29; V. Novo reino, novo templo e novo culto: 40,1-48,35.

8.4. Os profetas do período pós-exílico

Nesta seção, apresentaremos Joel, Abdias, Ageu, Zacarias e Malaquias.
a)   Joel - I. 1,2-2,27: um desastre agrícola, constituído por uma praga de gafanhotos (1,2-12) e uma grande seca (1,13-20), fazem o profeta pensar em calamidades maiores. Em 2,1-11, a sua imaginação transforma os gafanhotos num exército que vem destruir a cidade. Esta catástrofe nacional é um convite à conversão (2,12-17), que proporciona a resposta de Deus (2,18-27). II. 3,1-4,21: os acontecimentos anteriormente descritos são elevados à categoria religiosa de «Dia do Senhor». Joel, para além da efusão do espírito, joga com três temas: os sinais no céu e na terra (3,3-4; 4,15-16); a salvação de Judá (3,5; 4,16b), manifestada no plano político (4,17) e econômico (4,18), e a condenação das nações estrangeiras (4,1-14).
b)   Abdias - v.1: o título. v.2-14: exortação à luta contra Edom, contra quem é pronunciada uma profecia (v.2-9), por se ter regozijado com a destruição de Jerusalém e ter contribuído para agravar os seus sofrimentos (v.10-14). v.15-21: fala-se do «Dia do Senhor», que trará consigo a ruína de todos os povos e o começo de melhores dias para Israel.
c)    Ageu - 1.° oráculo: 1,1-15; 2.° oráculo: 2,1-9; 3.° oráculo: 2,10-19; 4.° oráculo: 2,20-23.
d)    Zacarias - Introdução (1,1-6): um apelo à conversão. Primeira secção (1,7-6,15): é a secção principal do livro. Apresenta-nos oito visões com breves oráculos disseminados pelo meio daquelas. Segunda secção (7,1-8,23): é um conjunto de oráculos, que surgem numa aparente desordem.
e)    Malaquias - Depois de uma introdução (1,2-5), em que se fala da eleição de Israel, seguem-se alusões às faltas cometidas contra a aliança de Levi pelos sacerdotes e pelos fiéis (1,6-2,9), aludindo-se a um culto uni­versal. Vem, depois, uma série de queixas contra os casamentos mistos e os divórcios (2,10-16). Em seguida, o profeta anuncia “o Dia do Senhor” (2,17-3,5) com a purificação do sacerdócio. As dificuldades que os israelitas experimentam acabarão quando estes voltarem a cumprir os seus deveres cultuais (3,6-15). No “Dia do Senhor” os bons serão recompensados e os maus castigados (3,16-21). Um apêndice (3,22-24) exorta à obser­vân­cia da Lei de Moi­sés e refere uma futura vinda do profeta Elias.



[1] MERRILL, 2009, p. 473-539.
[2]SMITH, Mark S. O memorial de Deus. São Paulo: Paulus, 2006, p. 92-93.
[3]ALEXANDER, T. Desmond. Jonah and Genre. Tyndale Bulletin, v. 36, 1985, p. 35-59.

7º - Literatura Sapiencial


LITERATURA SAPIENCIAL

7.1.  Introdução

Assim como os gregos desenvolveu a filosofia, os hebreus desenvolveram a literatura sapiencial. Não se trata de uma exclusividade dos hebreus, pois, todo o Oriente antigo tinha obras como aquelas. A hokmah (“sabedoria”, em hebraico) é um conhecimento prático do funcionamento da vida baseado na experiência.[1] Ela é marcada por reflexões sobre a situação da vida as pessoas e atitudes recomendadas frente aos acontecimentos. Em Jó, por exemplo, aparece o problema da difícil situação do homem, Deus diante desta situação e como ela pode ser resolvida. Diríamos que na literatura sapiencial, a religião normativa parte para situações concretas harmônicas ou até mesmo contraditórias para dizer o que Deus quer do homem.[2] Esta classificação inclui sete livros: Jó, Provérbios, Eclesiastes, Cânticos dos Cânticos, Sabedoria e Eclesiástico. Incluiremos os salmos na Poesia.
A sabedoria de Israel se insere no amplo contexto do Oriente Próximo. Obras sapienciais são encontradas na Mesopotâmia, Assíria e Egito. A literatura babilônica tem um exemplar similar ao livro de Jó. Ele é o “Poema do justo que sofre”.  É, provavelmente, uma composição do período entre 1.500 a 1.200 antes de Cristo. Um devoto do deus Marduque reclama que a divindade o abandonou, seus amigos também. A temática é a mesma de Jó, uma indagação sobre porque o justo sofre.[3] Na obra “Teodiceia Babilônica”, há também uma reclamação sobre o sofrimento humano, mas desta vez o que incomoda é a pobreza. A indagação sapiencial que entender porque o pobre mesmo sendo justo e fiel a Deus não é socorrido e sofre privações.
Dois contos egípcios também compartilham a temática de Jó: a) O Diálogo  do  desesperado  com  sua  alma (2190-2040  a.C.) – o personagem desiludido com a vida, sentindo-se abandonado pela sua alma, tenta se matar. A alma tenta lhe convencer a viver, falando dos prazeres da vida; b) Os protestos do  camponês  eloquente(séc.  XX-XVII  a.C.) – um camponês vítima de um crime faz longos discursos sobre a justiça.[4]
Aos moldes do Eclesiastes, há um conto acádio chamado de “Um diálogo sobre a miséria humana”. O herói dialoga com o amigo sobre a justiça divina e o sofrimento humano. Ele reclama dos problemas suportados. O livro reflete sobre as conseqüências das virtudes e dos vícios na vida.[5] Estes textos podem ter influenciado a literatura sapiencial de Israel, mas podem representar também o compartilhamento de tradições.

7.2. Jó

            O livro de Jó trata de um dos maiores desafios da vida humana: o sofrimento. A ênfase está no sofrimento dos justos. O enredo do livro gira em torno do drama do homem perfeito que perde a riqueza, a família e a saúde. O livro pode ser estruturado da seguinte forma: 1. O Ataque de Satanás contra Jó (1, 1 a 2, 10), 2. Jó e seus amigos (2, 11; 31, 40), I3. A Mensagem de Eliú (caps. 32-37), 4. A Resposta de Jeová a Jó (caps. 38 a 42, 6) e 5. Conclusão (42, 7-17).
7.3. Provérbios

            Provérbios são uma coleção de máximas de instrução moral. Sua estrutura pode ser apresentada do seguinte modo: 1. Um discurso sobre o valor e a aquisição da verdadeira sabedoria (caps. 1 a 9). 2. Provérbios, intitulados “Os Provérbios de Salomão” (caps. 10.1 a 22,16). 3. Admoestações reiteradas sobre o estudo da sabedoria
intituladas “As palavras dos sábios” (22, 17 a 24, 34). 4. Provérbios de Salomão colecionados pelos homens de Ezequias (caps. 25-29). 5. As instruções sábias de Agur aos seus discípulos, Itiel e Ucal, e as lições ensinadas ao Rei Lemuel por suamãe (caps. 30, 31).

7.4. Eclesiastes

            Eclesiastes ou Qohélet é uma obra do pós-exílio. A obra começa falando da vaidade da vida. Todo o ciclo da vida é decepcionante. A preocupação da obra é saber qual a consequência do bem e do mal praticados. Apesar da vaidade e da brevidade da vida, o livro apresenta uma consolação lembrando das alegrias desta vida
A estrutura do livro pode ser apresentada deste modo: 1. A futilidade do prazer e da sabedoria humana (caps. 1, 2). 2. A felicidade terrestre, seus obstáculos e meios de progresso (caps. 3-5). 3. A sabedoria verdadeira e prática (6, 1 a 8, 15). 4. A relação entre a verdadeira sabedoria e a vida do homem (caps. 8, 16 a 10:20). 5. A conclusão (11, 1 a 12, 14).

7.8. Sabedoria

            Sabedoria é uma obra, geralmente, atribuída a Salomão, porém, sua composição pode ser situada entre 150 e 50 antes de Cristo. Seu ambiente de origem é Alexandria, no Egito. A atribuição a Salomão se deve à sua contribuição no início do gênero sapiencial. Podemos dividir este livro em três partes:
1. A Sabedoria e o destino do homem (1,1-5,23): descreve-se a sorte diversa dos justos e dos ímpios, à luz da fé; sendo a justiça imortal (1,16), Deus reserva a imortalidade aos justos.
2. Elogio da Sabedoria (6,1-9,18): origem, natureza, propriedades e dons que acompanham a sabedoria (7,22-8,1), como personificação de Deus (ver Pr 8; Sir 24); elogio da sabedoria, elevando-a acima dos valores mais apre­ciados neste mundo.
3. A Sabedoria na História de Israel (10,1-19,22): descreve-se a pre­sença e a atividade da sabedoria em toda a História do povo de Israel com espe­­cial incidência sobre o Êxodo (11,1-19,17), em forma de midrash e de con­tras­tes, que caracterizam o estilo desta terceira parte (11,4-15,19; 16,1-4.5-14.15-29; 17,1-18,4; 18,5-25; 19,1-21). Mas o autor também mani­festa conhe­cimentos profundos de outros livros: Génesis, Provérbios, Ben Sira e Isaías. Merece um relevo especial a brilhante polémica contra a idolatria.[6]

7.9. Sirácida

            Sirácida ou Eclesiástico é o único livro do Antigo Testamento que traz o nome do autor: Jesus Bem Sirac. O texto foi escrito em 180 antes de Cristo. O livro contém duas partes, sendo que a primeira tem um estilo sapiencial à semelhança de Provérbios (1-13 e 24-50), e a segunda reflete sobre a obra de Deus na história (42, 15-50, 29).
            Sirácida assim como Jó e Eclesiastes representa uma evolução do pensamento judaico. Eles creem na retribuição, no sentido trágico da morte, mas não sabe com Deus retribuirá aos atos de cada pessoa.  O seu tema principal é a Sabedoria como dom de Deus. Quem teme a Deus, ele concede a sua sabedoria.


[1]VON RAD, Gerhard. Teologia delAntiguo Testamento I, p. 405.
[2]MERRILL, 2009, p. 575-576.
[3] LÍNDEZ, José Vílchez. Sabedoria e sábios em Israel. São Paulo: Loyola, 1999, p. 24.
[4] ONELLA, Edneia Martins. Jó 14,13-17: significado teológico em seu contexto histórico-social. Dissertação de Mestrado. Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, Rio, 2013, p. 19.
[5] ONELLA, 2013, p. 21.

6º - Poesia Hebraica do Antigo Testamento


LITERATURA POÉTICA: POESIA HEBRAICA

6.1. Classificação da poesia do antigo Israel

A poesia épica pode ter sido uma forma de transmissão oral das primeiras tradições do Pentateuco. O Cântico de Débora exalta a vitória de guerra contra os inimigos de Israel (Jz5). É um tipo de poema javista pode sido composto por volta de 1.100 antes de Cristo. Hinos para celebrar uma vitória de guerra são encontrados no antigo Egito. Esta poesia épica é encontrada em outro exemplo: o Cântico de Míriam(Ex 15, 1-18).Provavelmente, um poema do século X. O poeta celebra a travessia do mar Vermelho.[1]
As primeiras palavras introduzem o motivo do poema: “Cantarei a Iahweh, porque se vestiu de glória; / ele lançou ao mar o cavalo e o cavaleiro.” Mas a celebração das proezas de Yahweh em favor dos israelitas chega até a conquista de Canaã e até a construção do templo.
Os Oráculos de Balaão são um conjunto de poemas que aparece também no Pentateuco: 1º poema - Nm 23, 7-10; 2º poema –Nm 23, 18-24; 3º poema – 24, 3-9; 4º poema – Nem 24, 15-19; e 5º poema - Nm 24, 20-24.  São oráculos de antes das batalhas. Do mesmo modo que são celebradas as vitórias, há poemas também que antevêem a vitória de um povo e a derrota de outro.[2]
As lamentações são outro subgênero da poesia hebraica. Mas também é uma obra do profetismo no livro “Lamentações”. Uma das mais antigas aparece em 2º Samuel 1, 1927. O autor lamenta a morte de Saul. O maior poema são aqueles chamados de Lamentações.São divididos em cinco poemas. Neste texto, o poeta chora o estado miserável de Jerusalém.
As bênçãos são exemplos de formas literárias com as Bênçãos de Jacó (Gn 49) e as Bênçãos de Moisés (Dt 33). Os dois textos têm em comum uma sequência de desejos, de exaltações e de condenações em relação às doze tribos de Israel.Eles são formas poéticas do período dos Juízes, mas podem ter surgido bem antes. No capítulo 33 do Deuteronômio, há um poema de exaltação do poder de Yahweh atribuído a Moisés. [3]
O Cântico de Davi em 2º Samuel 22, 1-51 é um exemplar de salmo fora da coleção dos livros dos Salmos. Ele é uma versão do Salmo 22. O poeta exalta o cuidado de Yahweh pelo seu fiel adorador. O texto pode ser situado entre os séculos IX e VIII antes de Cristo.[4] Em Habacuque 3, 1-19, há um salmo de exaltação do poder divino.

6.2. Os salmos

            O saltério é uma coleção de cento e cinquenta salmos. Os salmos podem ser classificados em três tipos básicos: os hinos, as súplicas e as ações de graça. São exemplos de hinos os Sl8; 19; 29; 33; 46-48; 76; 84; 87; 93; 96-100; 103-106; 113; 114; 117; 122; 135; 145 a 150. As súplicas podem ser individuais ou coletivas. Como súplicas individuais temos os Sl3; 5-7; 13; 17; 22; 25; 26; 28; 31; 35; 38; 42-43; 54-57; 59; 63; 64; 69-71; 77; 86; 102; 120; 130; 140 a 143. As súplicas coletivas são os Sl 12; 44; 60; 74; 79; 80; 83; 85; 106; 123; 129 e 137. As ações de graças são os Sl 18; 21; 30; 33; 34; 40; 65-68; 92; 116; 118; 124; 129; 138 e 144. Há também alguns gêneros mistos.[5]
            Os salmos trazem títulos com autoria. São notáveis os salmos atribuídos à família de Coré. Muitos salmos são atribuídos a Davi. Os salmos veem de vários séculos e autores diferentes. Eles representam diferentes situações da história de Israel.

6.3. Cântico dos Cânticos: um poema de amor

            Cântico dos Cânticos é um poema lírico.  Seu gênero literário específico é o cântico nupcial (epitalâmio). Este tipo de texto celebra o amor entre um homem e uma mulher. É uma obra do pós-exílio.
Na história de sua interpretação, houve uma alegorização do texto por causa de alguns sentirem que um poema de amor no cânone seria desconfortável. Os judeus o entenderam como o amor de Yahweh por Israel e os cristãos, de Cristo pela Igreja. Orígenes o entendeu com a busca da alma pelo Logos. Porém, a sua literalidade é inegável.  O poema fala do mistério do amor que une o homem à mulher.[6]
A divisão do livro: 1. A noiva nos jardins de Salomão (caps. 1, 2 a 2, 7). 2. As recordações da noiva (caps. 2, 8 a 3, 5). 3. As núpcias (caps. 3, 6 a 5, 1). 4. No palácio (caps. 5, 2 a 8, 4). 5. O lar da esposa (cap. 8, 5-14).


[1]CROSS JR, Frank Moore; FREEDMAN, David Noel. Studies in Ancient Yahvistic Poetry. Grand Rapids; Cambridge: William B. Eerdmans Publishing Co, 1975, p. 3.
[2]CROSS JR; FREEDMAN, 1975, p. 3.
[3]CROSS JR; FREEDMAN, 1975, p. 4.
[4]CROSS JR; FREEDMAN, 1975, p. 4.
[5]Classificação da introdução aos Salmos da Bíblia de Jerusalém (p.858-859).
[6] RONCHEY, Silvia. O Cântico dos Cânticos: a verdade sobre o amor escondida no mais erótico dos livros. Disponível em: <http://www.ihu.unisinos.br/78-noticias/563157-o-cantico-dos-canticos-a-verdade-sobre-o-amor-escondida-no-mais-erotico-dos-livros-artigo-de-silvia-ronchey>.Acesso em 04 ago. 2019.