Em
que a teologia pode contribuir para o Setembro Amarelo?
Quando começa a campanha do Setembro Amarelo, aparece nas redes
sociais um assunto muito polêmico que sua compreensão errônea mais atrapalha do
que ajuda. Há uma leitura fundamentalista da Bíblia que considera que suicidas
perdem a salvação. As pessoas fundamentalistas acabam insistindo nesta
interpretação e promovem um grande desserviço para a luta pela prevenção ao
suicídio. Este é um exemplo de mau uso da Bíblia. O fundamentalista insiste que
quem pensa o contrário está ignorando a Bíblia e que ninguém mais conhece a
verdade. São argumentos mais comuns para sustentar a todo custo a condenação
moral do suicida. Nesta argumentação, precisamos ter claro que não estamos
defendendo o suicídio, estamos argumentando a favor do respeito à memória do
suicida.
Primeiro
– há personalidades bíblicas que desejaram a morte. Algumas
personalidades bíblicas enfrentaram situações difíceis que as levaram a pedir a
morte: a) O profeta Elias pediu a Iahweh
para que lhe tirasse a vida (1 Rs 19, 4); b) Jó diz que preferia morrer
estrangulado a passar pelo sofrimento (Jo 7, 15); c) Moisés lamenta com Iahweh as dificuldades em liderar os
israelitas pelo deserto e pede a morte (Nm 11, 14). São situações humanas. Em todos estes casos,
Deus não condena a atitude dessas pessoas, ele, antes de tudo, as encoraja e lhes
devolve a esperança.
Segundo
– há casos de suicídios na Bíblia. Podemos analisar três
casos de suicídio no Antigo Testamento. Em 2 Sm 17, Aquitofel se enforcou por
causa de um plano malogrado. Há duas outras situações: Em 1 Sm 31, 1-6, Saul
suicida diante da ameaça dos inimigos. Sansão suicida puxando as colunas da
casa sobre ele e seus inimigos (Jz 16, 28-30). São suicídios em situação de
guerra. Mas mesmo Sansão cometendo um suicídio, ele é incluído no rol dos
heróis da fé em Hebreus 11. No Novo Testamento, temos o episódio notório do
enforcamento de Judas (Mt 27, 5). Neste caso, a atitude de Judas é mais
condenada por ter traído Jesus do que por ter se enforcado.
Terceiro
– não há relação entre suicídio e condenação eterna, literalmente, na Bíblia.
Não existe nenhuma condenação explícita dizendo “os suicidas não herdarão o
reino dos céus”. Quanto aos homicidas, sim, existe claramente uma condenação.
As argumentações de condenação do suicida parte de outras premissas. E não de
casos e de citações diretas do texto bíblico. Aliás, a posição de Jesus é a de
que todos os pecados podem ser perdoados, exceto o pecado contra o Espírito
Santo (Mc 3, 28-30). Além disso, o próprio Jesus insiste para que não julguemos
os outros (Mt 7,1).
Por
último - a misericórdia precisa exceder o juízo. Quando
você quer usar a Bíblia para condenar as pessoas, você encontrará muitas
razões. De fato, há muitas atitudes que os autores bíblicos condenam e que
nossa ética contemporânea também condena. Porém, do ponto de vista da moral de
Jesus, temos de propor mais a ajudar do que a condenar: “Sede misericordioso
como o vosso Pai é misericordioso” (Lc 7, 36). Portanto, considerando que as
causas do suicídio têm relações patológicas. Não podemos condenar as pessoas
por estarem doentes, antes de tudo, precisamos ajudá-las a ser tratar. Está aí este
esclarecimento para que se evite o uso da Bíblia para fins indevidos!
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